18 janeiro 2006

Opus Dei


Raramente elogio algo publicado em uma revista da mídia gorda, mas a matéria da revista Época desta semana, "A vida íntima do Opus Dei", presta um serviço ao país.

Quem acompanha o Observatório da Imprensa já leu Dines criticar o poder crescente desta bizarra organização fundamentalista nos meios de comunicação. O presidente da Associação Nacional de Jornais é numerário do Opus Dei e escreve quinzenalmente no Estado de São Paulo. Sobre religião? Não. Sobre mídia e comunicação? Também não. O tema quase sempre é política, quase sempre atacando o governo e defendendo posições ultraconservadoras. E quem é o candidato da Opus Dei à presidente? Geraldo Alckmin!

Vou iniciar a campanha para presidente em 2006 "Qualquer um, menos o Alckmin!".

O mais recente dos muitos textos de Alberto Dines sobre a Opus Dei: aqui.

Artigo escrito por Sebastião Nery para o Tribuna da Imprensa (18/01/2006) :

Os cilícios de Alckmin

Longos escapulários grenás sobre os ombros, cabelos aparadinhos de recrutas milionários, brandindo seus estandartes medievais de Ricardo Coração de Leão, lá vinham desfilando pela Avenida Rio Branco, no Rio, os meigos donzelos da TFP (Tradição, Família e Propriedade), que o humor carioca apelidou de "capão-vermelho" (nem frango, nem franga).

Era o exército pessoal do estranho solteirão Plínio Correa de Oliveira, constituinte de 1934 por São Paulo, eleito pela Liga Eleitoral Católica, jornalista, ridículo e retardatário cruzado da Idade Média em pleno século XX.

Na ditadura, Magalhães Pinto saía de seu escritório no Banco Nacional, esquina de Rio Branco com Ouvidor, viu os marchadores da TFP poluindo a avenida e atrapalhando o trânsito, e disse a um jornalista:

- Esses rapazes são uns privilegiados. São os únicos brasileiros que podem gritar na rua.

"Opus Dei"

A TFP implodiu em escândalos em 84, Plínio Correia morreu em 95. Mas há uma outra instituição com o mesmo DNA, mais discreta e muito mais perigosa, porque meio secreta, quase maçônica, a "Opus Dei" (Obra de Deus), encravada dentro da Igreja e oficializada como "prelazia pessoal do papa".

Fundada em 1928 na Espanha pelo padre José Maria Escrivã de Balaguer (deixou um livro-Bíblia, "O caminho", com "999 ensinamentos"), morto em 1975 e canonizado já em 2002 pelo papa João Paulo II, a obra, ultraconservadora, tem 85 mil membros no mundo (2 mil padres, 83 mil leigos, 55% mulheres), milhões de "cooperadores" e US$ 2,8 bilhões.

A "espinha dorsal" da "Opus Dei" (embora "Opus" seja palavra neutra, eles gostam de chamar-se "o Opus") são os "numerários: leigos e leigas celibatários que vivem nos centros da instituição, cumprindo um ritual diário de rezas e mortificações (cilícios amarrados ao corpo, ferindo-se duas horas por dia, e flagelos para chicotear as nádegas nuas uma vez por semana), e os supernumerários, que podem casar-se, ter filhos e patrimonio próprio".

Polanco

Desde a Espanha, onde nasceu na ditadura de Franco e a Itália, onde se fortaleceu na ditadura de Mussolini, a "Opus Dei" tem uma estratégia central: ocupar a imprensa e o ensino (colégios e universidade) para ocupar o poder. Ela investe pesado na imprensa e em jovens quadros jornalísticos e políticos.

Esse insaciável Jesus Gutierrez Polanco, dono do "El Pais", o maior jornal da Europa, rei e monopolizador do livro didático em todos os países de língua espanhola e portuguesa, que já invadiu o Brasil com suas editoras Santillana e Planeta (aqui, já comprou também a Editora Moderna, a Salamandra e outras), é um filho dileto e poderoso general da "Opus Dei".

Na "Época" desta semana, em minuciosa e excelente matéria, Eliane Brum e Débora Rubin dissecam a "Opus Dei" e mostram seus tentáculos na imprensa e na política brasileira: "Por dentro do Opus Dei - Os segredos da organização mais poderosa e influente dentro da Igreja Católica".

Di Franco

E é aí que surge o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, com seu ar de angélico e piedoso sacristão, como imenso capital de giro da "Opus Dei":

1 - "Carlos Alberto Di Franco (que pontifica sempre na "Folha"), 60 anos, é um dos numerários mais influentes e bem relacionados do Opus Dei. Representante no Brasil da Escola de Comunicação da Universidade de Navarra, do Opus Dei, e diretor do Master em Jornalismo, um programa de capacitação de editores que já formou mais de 200 cargos de chefia dos principais jornais do País, é citado no livro "Opus Dei - Os bastidores", como o executor da política da obra para a mídia no Brasil e na América Latina".

2 - "Nos últimos anos, tem feito periodicamente uma preleção sobre valores cristãos na ala residencial do Palácio dos Bandeirantes, em São Paulo, a convite do governador Geraldo Alckmin. O encontro, apelidado de Palestra do Morumbi, reúne um seleto grupo de empresários e profissionais do Direito, entre eles o vice-presidente da Fiesp, João Guilherme Ometo".

Morumbi

Em entrevista à "Época", Di Franco revela coisas curiosas (e perigosas):

1 - "As palestras do Morumbi, que acontecem na última quarta-feira do mês, no palácio, com o governador e um grupo de empresários e professores, nasceram de uma conversa do governador com um sacerdote da obra, o padre Teixeira, com quem ele tem direção espiritual periódica. Sou o palestrante".

2 - "A proibição de ir ao cinema, teatro ou estádio de futebol não é conflitante com meu trabalho de jornalista. Pare mim nunca foi problema. Não é que não pode. A expressão está mal colocada. Não vai ao cinema porque não quer ir ao cinema. Os numerários vivem voluntariamente uma série de abstenções em função de sua entrega como numerário".

3 - "O cilício é uma mortificação corporal ultratradicional na Igreja. Uso duas horas por dia, como qualquer numerário. Se quer saber, sou virgem".

Alckmin já era o candidato da Febraban, Fiesp, TFP. Agora, "Opus Dei". Só faltam os Templários. Vota nele quem quer. Mas sabendo que já tem dono.


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